Familiaridade do crime

>> setembro 11, 2009

No auge da tragédia contemporânea entramos na familiaridade do crime. As fontes de criação parecem ter secado. O medo petrifica um mundo povoado de fantasmas e de máquinas. E nele, os algozes humanistas, celebram o seu culto envolto em silêncio. Que clamores os perturbariam? Os poetas, esses perante o assassínio do seu irmão, declaram altivamente que têm as mãos limpas. O mundo inteiro desvia-se: abstrai-se do crime; as vítimas acabam de mergulhar no cúmulo das suas desgraças: aborrecem os outros. Nos tempos antigos, o sangue do assassínio provocava pelo menos um sagrado horror que desse modo santificava o preço da vida. O que condena verdadeiramente esta época é o dar a impressão de que, pelo contrário, ela não é suficientemente sangrenta. O sangue já se não torna evidente; não salpica bem até acima os rostos dos nossos fariseus. Eis o extremo do niilismo: o assassínio cego e furioso converte-se num oásis, e o criminoso imbecil parece repousante ao lado dos nossos inteligentíssimos carrascos.

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